História: Jundiaí celebra 80 anos da ‘revolução rosada’
Publicada em 17/01/2014 às 19:44Uma festa preparada sob o impacto do sucesso das uvas da variedade Niagara Rosada, surgidas em Jundiaí com uma “mutação somática” no ano anterior, inundou de visitantes as ruas do centro da cidade em janeiro de 1934. Com camponesas (vinhateiras) desfilando sobre carros de boi em meio aos primeiros automóveis e cordões carnavalescos se misturando à multidão, a exposição de uvas aconteceu no antigo mercado municipal (depois Centro das Artes) e uma exposição industrial ocupou a área do então grupo escolar Conde do Parnaíba.
Se é difícil imaginar essas cenas depois de 80 anos, os visitantes da 31ª Festa da Uva e 2ª Expo Vinhos de Jundiaí vão encontrar imagens restauradas pela equipe do Centro de Memória, departamento de pesquisas do Museu Histórico e Cultural, entre as atrações da festa que acontece entre 30 de janeiro e 16 de fevereiro.
“Além das imagens, recebemos uma raridade que é um vídeo educativo feito pelo saudoso Hilário Caniato na década de 1950 sobre o cultivo da uva. É algo muito poético até”, afirma a socióloga Creusa Claudino. Os visitantes vão conhecer o sentido de termos como enxertio, “cavalo”, poda de cultivo e poda de colheita.
Um efeito do impacto dessa primeira festa, realizada ainda no governo do prefeito Antenor Soares Gandra com o governo estadual em 1934, é o fato de quase 20 anos depois ser aberto um parque projetado para ela – foi em 1953, pelo prefeito Luiz Latorre, com assessoria técnica do arquiteto e prefeito anterior, Vasco Venchiarutti. E ainda hoje, em 2013, muitos moradores ainda referem-se ao Parque Comendador Antonio Carbonari como “Festa da Uva” ou “Parque da Uva”. Assim como, em todo o Brasil, a cidade passou a ser reconhecida como “Terra da Uva”.
Um aspecto curioso observado pelo historiador Alexandre Augusto de Oliveira, também do Centro de Memória e Museu Histórico, é que a imagem de modernidade dada pela “nova” uva rosada atraiu a indústria para o evento, gravado em diversas fotos da época como 1ª Exposição Vitivinícola do Estado em Jundiaí.
Sob uma fachada cenográfica na frente da escola Conde do Parnaíba, pequenas e médias empresas jundiaienses de mobiliário, cerâmica, tecelagem, alimentação e até brinquedos surpreenderam os visitantes na 1ª Exposição Industrial de Jundiaí, também organizada em parceria do governo estadual (federal). A tecnologia também estava presente no cotidiano dos agricultores, permitindo levar rapidamente (de trem ou caminhão) seu produto aos consumidores até mais distantes.
Na inauguração da dupla exposição o interventor federal no estado, Armando Salles de Oliveira, representava o governo nacional de Getúlio Vargas que apenas dois anos antes havia superado uma rebelião paulista e ajudava a tornar o evento um resgate de autoestima.
Não que a uva ou o vinho fossem novidade na vida da antiga Jundiahy. A segunda edição do livro “Uvas Para o Brasil”, de J.R. Inglez de Souza (Editora Fealq) mostra que em 1669, quando a cidade era apenas um povoado aberto nas clareiras do seu grande mato grosso, o cartório do 1º Ofício já registrava a venda de vinho de uva produzido na terra.
Mutação
A produção maior, entretanto, viria somente no final dos anos 1800 com a chegada da variedade de uva Isabel e a mudança das grandes fazendas de café para os pequenos sítios de imigrantes. Depois viria a Niagara Branca, até a mutação que originou a variedade rosada em 1933 na região entre Traviú e o então bairro de Louveira.
“A partir daí, declina vertiginosamente a população de Niagara Branca substituída aceleradamente pela mutação Rosada e estabelece-se a fisionomia do vinhedo bandeirante, o maior centro produtor de uva do Brasil”, registrou Adriana Renata Verdi, do Instituto de Economia Agrícola (IEA).
Em um dos depoimentos gravados pelo videasta Rodrigo Tangerino para o projeto que deve ter continuidade depois do evento, no Centro de Memória instalado na praça dos Andradas, o agricultor Orlando Steck relembra que a primeira remessa de uvas da variedade Niagara Rosada para o Rio de Janeiro não foi aceita pelo estranhamento da cor. “Então as famílias daqui mandaram novamente, com o dobro do preço, mostrando tratar-se de algo com mais qualidade. E foi um êxito“, disse.
O caráter popular da primeira festa, ao mesmo tempo em que atraiu diversos segmentos da comunidade e da economia, foi muitas vezes destacado pelo saudoso pesquisador Geraldo Tomanik – que citava as barracas de acampamento em praças do Centro como um dos principais efeitos do número inesperado de visitantes. A primeira rainha da festa? Foi Santina Martini, ou simplesmente Santa Martini.
Depois de um período de decadência, a Festa da Uva retornou ao seu formato de foco comunitário em 2013. No mesmo ano, a cidade iniciou, com apoio do prefeito Pedro Bigardi, o processo para tornar-se uma região demarcada para a produção de uva Niagara com certificação de origem.
Por José Arnaldo de Oliveira
Fotos: Reprodução e Fotógrafos PMJ
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