Escadão une memória de idosos às sensações de jovens
Publicada em 14/05/2016 às 21:12Se a escadaria reta ou a rampa sinuosa ligam a parte baixa e a parte alta do antigo “Morro do Grupo”, na nova Esplanada Monte Castelo (Escadão), o mesmo ocorre simbolicamente entre a memória dos idosos e a descoberta dos jovens. Muitos moradores da cidade conheceram, no entardecer do sábado (14), o resultado da reforma, que durou um ano de trabalho.
O ex-operador de projetor do Cine Teatro Polytheama, Arthur Gozo, saiu da Ponte São João com o filho para conhecer – e aprovar – o trabalho no espaço que estava abandonado. Aos 90 anos de idade, lembra de cenas curiosas.
“Antes da urbanização na década de 1940, muitos usavam uma folha de palmeira ou bananeira para descer escorregando morro”, conta com bom humor. O local também era usado pelos mensageiros que corriam para levar rolos de filmes que eram usados por diversas salas de exibição no Cine República, na Vila Arens.
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Muitas crianças também foram levadas pelos pais para a reinauguração do local, conhecido popularmente como Escadão e reconhecido oficialmente no conjunto como Esplanada Monte Castelo, e se divertiram com a presença de atores vestidos de personagens de desenhos animados ou que atuavam como “sombras” dos visitantes.
Algumas delas ouviram histórias, como as contadas pelo comerciante de bicicletas Réges Donatti, que veio da Vila Arens para conhecer o resultado da reforma. Ele ainda tem nítidas na memória as imagens de adolescência, onde viu moradores aproveitando as rampas antigas do local para a descida de carrinhos de rolimã.
Já a aposentada Helena F. Pace, que chegou a Jundiaí em 1946 com os familiares que vieram trabalhar no Lanifício Argos, lembra-se muito bem do uso cotidiano do Escadão pelos moradores e da praça existente em seu ponto mais alto, ainda antes da Câmara Municipal, como ponto de encontro de amigos, de namorados, de descanso da subida íngreme de 120 degraus e de admiradores da bela paisagem que se descortinava. “Espero agora que novas gerações possam aproveitar esse lugar”, afirmou.
Entre os “capacetes” das luminárias ou o trocadilho com as “pracinhas” criadas ao longo do circuito de subida e descida, a homenagem aos soldados jundiaienses que lutaram na 2ª Guerra Mundial contra o nazifascismo na Itália era lembrada por histórias como o teste do primeiro jipe que subiu o morro em 1945 em uma época onde o quartel do Centro brilhava com os cavalos dos oficiais. Para Jussara Rita Lamarca, autora do livro “História Sob os Degraus” a reforma resgata parte da própria cidade.
“Precisamos disso, valorizar o sentimento de pertencimento para todos que usarem a cidade, formando uma ligação entre as gerações. E nisso a história oral tem um grande papel”, afirmou.
Morador do bairro do Champirra, o agricultor César Rezende concorda. Ele afirma que trabalhos como na Ponte Torta e agora no Escadão, entre outros, mexem com o orgulho dos jundiaienses. “Estou na cidade há mais de quarenta anos e concordo com a valorização que o atual prefeito tem buscado para a cidade”, afirma.
O arquiteto e memorialista Roberto Franco Bueno, com um broche da Associação dos Engenheiros e um terno impecável para participar do evento, concorda. Ele foi autor do projeto que reformou a Escola Industrial (atual Escola Estadual Antenor Soares Gandra), em 1969, que também criou a alça de acesso da rua Barão de Jundiaí a partir da avenida Paula Penteado, a antiga Rua Torta.
Morador do Centro, ele destaca a importância das soluções técnicas de cada época. “Isso era um belvedere, um mirante onde a rua terminava. Tivemos que usar soluções de arrimo de pedras para formatar o acesso. O projeto recoloca essa oportunidade de contemplação em outros pontos possíveis do trajeto”, afirmou.
A Esplanada Monte Castelo (Escadão) é cercada por pontos de referência como a Pinacoteca (antigo Grupo Escolar), o Teatro Polytheama, o Projeto Guri, a Ponte Torta e o Complexo Argos, entre outros.
“É uma ligação entre essas coisas, mas era de cotidiano mesmo. Muitas fotos antigas do local são do meu avô, que era mecânico mas tinha o hobby da fotografia, e meus familiares moravam perto. Era tranquilo inclusive à noite. A gente saía do cinema às nove ou dez da noite e passava por aqui. Espero que o projeto dê vida novamente a esse espaço tão importante da nossa cidade e que as novas gerações deem valor a tudo isso que a gente tem”, afirmou o aposentado Antonio Padovani, 70 anos.
No meio da festa de reabertura, muitos encontros no velho e novo Escadão. A monitora ambiental Patrícia Polli conheceu o músico Fábio Porte, autor de canção sobre a Serra do Japi. O músico Hamilton Ramalho, da Vila Arens, aproveitou o evento para conversar com o chef de cozinha Dago Nogueira. E assim por diante.
A arquiteta e secretária de Planejamento e Meio Ambiente, Daniela da Camara Sutti, não deixou de lembrar que iniciativas desse tipo não tratam apenas de obras físicas. “São histórias de vida que vemos aqui”, afirmou.
José Arnaldo de Oliveira
Fotos: Alessandro Rosman
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